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As tarifas como arma negocial pela Prof.ª Inês Quadros

Segunda-feira, Fevereiro 10, 2025 - 17:41
Publicação
O Jornal Económico

A dependência da Europa não é apenas económica, é também organizacional: falta uma política de defesa verdadeiramente única na União, que a permita ser eficiente e robusta na resposta aos conflitos.

Depois de anunciar um aumento de tarifas aduaneiras nos produtos provenientes do Canadá, México e China, Trump recuou em relação aos dois primeiros, acordando uma suspensão do aumento em troca da garantia de reforço de segurança nas fronteiras com os EUA por parte desses Estados.

Press - As tarifas como arma negocial

Um dos princípios basilares da Organização Mundial de Comércio, da qual os EUA fazem parte, é o de não discriminação entre os membros da Organização, traduzido na regra da “nação mais favorecida”: cada Estado permanece competente para cobrar tarifas alfandegárias, mas os benefícios (sejam tarifas, medidas fiscais ou outro tipo de imposições internas) que sejam concedidos a algum Estado devem ser “imediatamente e incondicionalmente” estendidos a todos os outros Estados-parte. O objetivo é claro: que os produtos sejam tratados do mesmo modo independentemente da sua origem, preservando as suas oportunidades concorrenciais.

A decisão da administração americana a respeito do aumento das tarifas, tomada ao abrigo da “International Emergency Economic Powers Act” invoca razões relacionadas com o tráfico de armas e de drogas, o combate ao terrorismo e à imigração ilegal, o que sugere que a linha defendida por Trump é a de justificar o aumento à luz da exceção prevista no artigo XXI do GATT, que permite aos Estados-membros tomarem “todas as medidas que julgarem necessárias à proteção dos interesses essenciais da sua segurança”. Trata-se de um instrumento excecional, que apesar de tudo tem sido utilizado com maior frequência nos últimos anos dada a (este respeito, conveniente) conjunção de crises económicas e de segurança globalizadas.

A Europa encontra-se numa posição diferente da dos Estados visados pelas decisões da nova administração norte-americana, e os instrumentos que Trump tem ao seu dispor para justificar um aumento de tarifas não serão os mesmos. Por outro lado, a União Europeia constitui um bloco aduaneiro único, o que reforça a sua posição negocial, pois o volume de trocas com os EUA é significativamente maior do que em relação a cada um daqueles três Estados.

O calcanhar de Aquiles europeu está, porém, na dependência em relação aos EUA em matéria de defesa, sobretudo em conflitos, como o da Ucrânia, nos quais os riscos são muito maiores para a Europa do que para os EUA. Essa dependência não é apenas económica, é também organizacional: falta uma política de defesa verdadeiramente única na União, que a permita ser eficiente e robusta na resposta aos conflitos. Não é improvável que a negociação de tarifas arraste consigo esse tema, o que é apenas mais uma razão que nos devia levar a falar a sério da defesa na União Europeia.