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PENSAR DIREITO | Novidades do mundo jurídico da droga

Friday, October 28, 2022 - 01:00
Publication
Jornal Económico Online (O)

Em três meses, três passos fundamentais para uma política de drogas mais racional, proporcional e baseada nos direitos humanos. Uma questão relevante que não deve passar despercebida.

No mundo as coisas avançam, pelo menos no mundo jurídico da droga. Em três meses, três passos fundamentais para uma política de drogas mais racional, proporcional e baseada nos direitos humanos.

No início do mês de outubro, o Presidente Biden voltou a uma promessa de campanha, dizendo que ninguém deve estar preso por posse de canábis. Anunciou indultar todos os crimes federais por posse e iniciar uma revisão da classificação jurídica desta substância (que atualmente se encontra classificada com a mesma perigosidade da heroína, o que equivale a ter no mesmo plano a Nerf do meu filho Nicolau, mesmo a maior de 40 balas, e uma G3 verdadeira). Como a maioria das pessoas presas nos EUA por posse de canábis estão em cadeias de cada um dos estados, o Presidente recomendou que os Governadores iniciassem um processo semelhante de perdões.

A medida apesar de tardia é justa, sobretudo num país em que há uma gigante desproporção de minorias raciais presas (negros e hispânicos) por estes crimes. Apesar de a canábis já ser legal nos EUA num conjunto de estados onde vive a maioria da população, fica assim aberto o caminho para uma legalização generalizada, a nível federal, à semelhança do que aconteceu em 2018 no Canadá.

Menos noticiado do que a decisão Biden, em julho, de um modo quase despercebido, três países europeus, fizeram um Joint Statement sobre canábis. Uma declaração conjunta assumindo o falhanço das políticas proibicionistas quanto à canábis, e a necessidade de soluções no quadro do Direito da União Europeia. O documento, assinado por vários ministérios da Alemanha, Luxemburgo e Malta, afirma, como nunca antes tinha sido afirmado a este nível, que "o status quo não é sustentável".

Por último, foram conhecidos na semana passada os detalhes da legalização da canábis que ocorrerá na Alemanha. Muitas das medidas são equilibradas (limitação de THC, talvez não nos níveis propostos; limite à posse por pessoa em 20 gramas), mas parece apontar-se para produção exclusivamente nacional. O documento vai agora começar a ser discutido e será alterado até ao projeto legislativo, que se iniciará até ao final do ano.

Numa altura em que também a Holanda e a República Checa se preparam para regular a canábis, e que o parlamento português tem já um projeto sobre o tema na Comissão de Saúde, começa a ser inevitável que as leis e instituições europeias comecem a adaptar-se para permitir e enquadrar esta nova realidade inevitável, e adaptar a liberdade de circulação a um produto com características próprias: não parece plausível que, pelo menos no início, as trocas comerciais de canábis entre estados membros sejam absolutamente livres, sem obrigações declarativas e controlos que permitam evitar que a canábis acabe em países que não legalizaram; mas também não se pode proibir qualquer forma de comércio intraeuropeu. Estejamos atentos. João Taborda da Gama, Advogado, Docente da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa

João Taborda da Gama | Professor da Escola de Lisboa da Faculdade de Direito da UCP